quarta-feira, 31 de maio de 2006

Cúmplice
Devagar, sediciosa, silente Escorregas, infiltras, escoas, pelos orifícios de minha alma e te aninhas como claridade nos meus recantos mais obscuros... Insistente, a tua palavra me chama e ecoa, nos meus fundos mais fundos, abissais, reverberando boas novas fazendo promessas de paz Que toda essa doçura que conjuras se reverta em ti, força coragem, bálsamo aos teus delicados pés. Que tua semeadura seja fértil que o cansaço não te colha e que mesmo sem o merecer eu possa de te receber, preciosa toda a luz que tu me trazes. beijo-te sempre com os beijos da minha boca digo-te sempre as palavras que são só para você porque te beijo sempre com os beijos que são só teus e te falo sempre na paz que também é tua

segunda-feira, 29 de maio de 2006

SORTILÉGIO Um dia uma cigana leu a minha mão. Guerreiro? - Sorte nas armas; desgosto no amor. Num trejeito de ombros com desconfiança assenti. Eu era jovem e o coração, pulsava forte em meu peito. Arengas de velha, conclui. Muitas lutas em campos estranhos lutei. Por tênues fios tive a vida presa. Sempre venci. Sorte nas armas! Em estratégias cuidadosas, em planos bem traçados, por sina, como leão pelejei. Louros acumulei e Pelo poder não me deixei seduzir. Eu sempre venci! Fui magnânimo para com os vencidos... Hoje ha muito, o sol cruzou a linha do meio dia, da minha vida e a muitas mulheres conheci. Troféus de vitórias as vezes, generosas e sinceras em outras ocasiões. Brincadeiras de intervalo entre um momento e outro da eternidade. Uma só vez, de coração disparado lutei sem vontade de vencer. Uma flexa perdida me atingiu, depus as armas e me entreguei. Por amor sofri e ainda hoje sofro. A esta derrota amargo, em um coração cansado que as vezes parece querer desistir, Um dia uma cigana leu a minha mão. Guerreiro?: Sorte nas armas desgosto no amor! Eu deveria ter acreditado!
enigma lunar
No canto esquerdo do seu sorriso Bem abaixo dos seus olhos doces Flagrei em detalhes, a minha tragédia: Tu que não sabes ou dizes não saber Se o amor que por mim, tu sentes é forte verdadeiro e bom, me envias em cada detalhe do teu rosto que me fita com doçura uma apelo para que eu creia nos contos da lua cheia
que teima em nos alumiar. Como a lua, tens dupla mensagem. E se, com a boca pedes que me vá, em alegações tão pueris, quando me fitas com tanto carinho me sinto um pássaro no ninho que se recusa a voar.
Nisso és como a lua cheia Que teima em nos alumiar : tanto encanta por brilhar mas tem em sua luz fria pouca coisa para contar Em que devo eu, acreditar ?

domingo, 28 de maio de 2006

Carpe diem...
Deixe a santa em casa menina. Se solte nos rodopios, dance e cante com alegria, deixe viver a Catarina. "Carpe diem”, exulta o poeta que a noite é certa como certo é o fim do dia. A vida é curta, a morte é meta. Colhamos então, os frutos da poesia. Faça do passo, um passo primeiro enfeite os cabelos e venha sonhar Deixe a santa em casa menina, se solte nos rodopios dance e cante com alegria deixe viver a Catarina.
assédio infantil
O olhar lânguido da menina Com seios de caroço de azeitona quase criança, que ali, assim, assim, a mim se oferecia, Queria sexo?
Eu que podia, mais do que pai, ser quase seu avô não fiquei atónito, nem ao menos tive vômito. Confesso. Por um tempo bem maior, do que por um fugaz momento pensei que o sexo que ela queria era tão pouco sexo, quanto a solidão que eu sentia... E que talvez existisse Uma linha-traço que unia A mim, ao bêbado da calçada e a essa menina, tão novinha coitada, Com seios de caroço de azeitona Que ali assim, a mim se oferecia. E que essa linha, esse traço quem sabe fosse a ponte que ligasse estes quase todos sentimentos, sexo, solidão e desamparo ...
Rio, julho de 1999

sexta-feira, 26 de maio de 2006

Pensamento fino. Hoje quase sem perceber, durante todo o meu dia, eu só pensava em você. Pensava assim com jeito de quem não queria pensar. Num pensamento fino e cortante, que ia por debaixo das coisas que eu queria pensar direito.
Pensava assim como um defeito No meu jeito de pensar, um erro, uma falha de quem não quer se lembrar mas que se engana, e se deixa enganar, quando pensa para esquecer e se esquece para lembrar. Hoje o dia já se acabou, e eu ainda penso em você. Penso no que já pensei quando não queria pensar, E no que eu não pensei porque queria pensar. E penso, e repenso. De novo torno a pensar. E penso num pensamento, que me parece sufocar. Vai-te de mim, criatura í Anda ! Desata ! Saia do meu pensamento, Tal qual me saíste da vida. Deixa-me agora, vai, te afasta ! que a hora já é hora e eu preciso descansar. Pois se sigo pensando em ti Tu que me negas e me faltas, Eu que me cuide, pois não, que esse pensamento, qual faca, esse pensamento me mata
!

Lanterna dos Afogados: poemicídios e outras mortes!

bóia farol meta em desespero tudo puxa para o fundo dos abismos o mais banal dos instintos rege por total o ser salvar-se para encontrar ponto de apoio sobre-viver emerso ao custo do assassinato do poema quem se importa fazer da palavra poema coisa tão banal constranger as musas deixar em maus lençóis a poesia tratá-la sem pudor mero suporte socorro coisa palavra usada nos ritmos cardíacos renais venais do corpo em desespero que não quer morrer legitima defesa gosto gorduroso da vida

terça-feira, 23 de maio de 2006

TANTRA

Venha meu amor, Venha comigo, mas venha devagar: na noite deslizemos, para não acordar as estrelas. Conheçamos companheiros, os mistérios mais profundos de Deus tornado homem e mulher. Eu te dispo. Tu me despes. E nossa nueza crua assim tão nua, brilha mais do que a lua. Venha meu amor; devagar bebamos a doçura que dos olhos, este momento mágico exala. Eu te quero e tu me queres, mas não nos movamos; que assim tornados estátuas perpetuamos segredos, continuamos no gesto de minha mão

que toca ao rosto teu.
E rola na tua face uma lágrima solitária com que teus olhos me brindam brotando da emoção. E tremem os meus lábios, que a sorvem, sem no teu rosto tocar. Venha meu amor; que a morte não te assuste Morramos para tudo neste momento final. E agora é a tua mão, que com timidez, ao meu corpo toca, e deslizando docemente, falas ao meu coração: - Sim, contigo eu vou amor meu, da morte não tenho medo que morrer é neste instante sublimidade da paixão. E o seu corpo ao meu se cola. Perdidos estão os contornos, não sabemos mais quem somos, Não sabemos, tu e eu. E o teu corpo assim tão próximo, o teu seio tão macio o teu colo, teus cabelos o perfume que exalas... Tudo fala e tudo cala. Outra vez quedamos imóveis. Fechas teus olhos. Fecho aos meus. E nos abismos do ser em serenidade mergulhamos. Tudo é paz. Tudo é silêncio Tudo é só verdade. Assim, as almas libertas em proximidade tão distante voam voam pelo céus, e nem percebem a fusão que se operou neste instante. Não sei mais da minha carne e nem tu sabes da tua não sei mais do meu ser e tu não sabes do teu. E assim mantidos imóveis perdidos num tempo que não passa, descobrimos a eternidade: Tu me sabes e eu te sei! Nada é o que nos resta O milagre aconteceu!
Rio 4O°
Solitário, nos arcos da Lapa, A puta pediu: Vem gozar comigo, vem ! Vem gozar comigo, meu bem ! E eu, até que queria, ir com a puta, gozar com a puta. Não com a puta que pediu, Mas com a puta que me viu...
Junho de 1999 - Rio.

Muita agua para se afogar: contra costa de Itaparica

Nua pergunta.
Você, diante de mim, parada nua, me interpela. Quer saber em sua nudez perplexa, diante de mim, atónito do que eu nunca soube, jamais.
O desejo que escorre dos seus olhos. desce doce e empoça no umbigo pinga em gotas de perguntas que eu não sei responder.
O mistério que te constitui universo feminino ser mulher
não me é dado responder.
Certamente não sou daqueles
a quem este alfabeto,
é dado lê-lo.
Percorro ansioso com meus olhos,
as suas formas
com as pontas dos dedos,
tateio o risco das letras
que o seu corpo desenha e que não sei decifar.
Percorro com minhas narinas todos os cheiros que em verdes pastagens me convidam
para em ti descansar.
Bebo em sua fonte. Deito a minha língua no seu cantil. Sorvo, sôfrego, delicias que nem sei nominar.
O que queres de mim mulher, mais do que posso te dar ? Se o que me perguntas é o que não sabes responder, por que estimas que eu tenha a resposta para te dar.
Pois de tudo que pude saber, O teu desejo não cala, mas também não sabe falar.

segunda-feira, 22 de maio de 2006

Sitio Lanterna dos Afogados

transverso Delicadas as fronteiras dos mundos em que habito e que, de um lado para o outro, sem perceber transito. Neles as coisas podem ser e não ser quase ao mesmo tempo, a depender somente das escolhas que fazemos, das cores que escolhemos, para cobrir a matéria fina do pensamento. Porque o que parece importar as vezes não tem importância própria. Mero pretexto, cenário ou trama, para exercitar o verdadeiro drama de se fazer escolhas e aprender com elas... O que será de nós, Ó minha senhora, que de escolha em escolha nos enredamos, se delas perdermos os seus sentidos, e esquecidos dos seus verdadeiros motivos, nos distraímos com aquilo que elas parecem ser? Sublime então o desafio de viver ao mesmo tempo sustentando o gosto das escolhas que fazemos e o fazer das escolhas que gostamos... Sendo ao mesmo tempo, ator e autor, da peça que vivendo escrevemos... Representando os sentidos que quaisquer outros, outros poderiam ser mas, que, sendo estes aqueles que escolhemos, nos fazem definitivamente ao vivê-los, eternamente responsáveis pelo que vivemos... O que será de nós minha senhora, é coisa que eu não sei... Mas eternamente nós seremos, responsáveis pelo que vivemos, e pelas escolhas que fazemos.