Invejo aos que se satisfazem com o sucesso profissional,
que se acham muito bons no que fazem,
e pensam que isso é o máximo.
Invejo aos que contentam com o amor dedicado
de uma bela mulher,
e imaginam que este é o melhor destino
que alguem possa almejar.
Invejo aos que mergulham de cabeça
em algum credo ou alguma fé
que calafeta os buracos de sua alma.
Invejo aos que se saciam,
ainda que intermitentemente
com alguma droga da moda
ou com a moda do uso
de alguma droga eletronica ou tecnologica
que projeta sons, imagens
ou um espetáculo completo de cada vez.
Invejo aos que gozam com suas maquinas e motores
carros, motos, lanchas ou jetski
ou sonham pilotar um dia um foguete espacial.
invejo os artificios sedativos
que fazem parecer
que o absurdo possa ter algum sentido.
"Come chocolates, pequena;
Come chocolates!
Olha que não há mais metafísica no mundo senão chocolates.
Olha que as religiões todas não ensinam mais que a confeitaria.
Come, pequena suja, come!
Pudesse eu comer chocolates com a mesma verdade com que comes!
Mas eu penso e, ao tirar o papel de prata, que é de folha de estanho,
Deito tudo para o chão, como tenho deitado a vida." (Alvaro de Campos)
Invejo não ser outra pessoa qualquer
que não fosse essa, que não consegue se esquecer,
do que é, que não sabe não saber
o tempo todo, todo o tempo, de si.
Me exploda consciencia cruel!
Me dissolva no ácido desta lucidez
fiat tenebras, apague-se a luz
e deixe que essa alma invejosa possa dormir em paz.
sábado, 11 de setembro de 2010
quarta-feira, 1 de setembro de 2010
Das artes da pequenez humana...
Ah, homem pequeno, eu te conheço bem.
Já fui como tu. Já padeci de tua pequenez.
Conheço este teu espírito vazio.
Conheço essa sombra que te ronda.
Sei do medo que te consome
e como reages mal a ele.
Sei do teu ímpeto em fazer parar a vida,
só porque não a compreendes.
Sei da angustia que te causa
tudo que é movimento e complexidade.
Gostas das coisas simples e lineares,
mesmo quando essa versão
já não corresponde exatamente aos fatos.
Sei da tua fúria a querer controlar o gozo alheio
porque tens medo que ele te possua
e que,sem auto-controle, morras de tanto gozar.
Sei o quanto te sentes medíocre e desprezível
na voracidade da tua fome em busca de poder,
ou da tua necessidade incessante
em te fazeres parecer que és maior do que és
e que tens alguma importância própria.
Ah, homem pequeno, sei que os da tua espécie
multiplicam-se como os ratos do esgoto,
dominam todas as instituições
e são os que melhor se dão, nos negócios do mundo.
Não tens apreço verdadeiro pela honra,
pela dignidade, pela verdade.
Estes artigos, em tuas mãos,
são sempre falsos brilhantes
mestre que és do embuste e da falsificação.
Sei da confraria que te faz ávido da companhia
daqueles que são da tua estatura.
E como se protegem uns aos outros
sempre com dedos em ristes a acusar
os que brilham por alguma luz própria
e desdenham da tua cartilha ensebada.
Gostas de te pensar a tu próprio
como se fosses um vencedor, mas tu o sabes,
no fundo de tua alma,
que és um derrotado de princípios,
mesmo quando logras, através da arte do engano
obter alguma matéria de valor.
O caminho para crescer homem pequeno
eu posso te ensinar, ainda que duvido
se me prestarás atenção,
tal te comprazes em ser
este ser pequeno que tu és.
Tome um espelho, destes, de tamanho bem grande,
coloca-te diante dele e suporte o sofrimento
que te infringirá a imagem que tens diante de ti.
Aceite a derrocada de toda ilusão,
converta-te no mero e mísero ser
que sendo o que és, é o que podes ser.
Repita dia após dia, com insistência
tal tipo de operação. Renda-te a dor.
Deixe-te perder na confusão do não ser,
até perceber o que resistiu, o que sobrou.
Tome esta semente pequena
e vê que, diminuta, ela contem alguma luz.
Te convertas, tu, que agora finalmente
sabes que és um nada,
em útero gerador deste novo ser.
E quando cresceres, serás como a mim,
que te olho assim em tua pequenez,
não com desprezo ou ódio,
mas paciência e compreensão...
Vá! Busca o espelho agora mesmo...
E te ponhas a trabalhar!
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