domingo, 30 de julho de 2006

BRASÍLIA 1979 No palácio reina o ditador geme no planalto a flor de concreto. O cerrado nunca dantes navegado se estremece em sua nudez descoberto. Nos versos minha conspiração de poeta. Distante, a revolta, no calor do povo, transpira. Aqui o poder tem o seu lugar paletós de chapas brancas burocratas de gravatas atam e matam por decreto, o novo: o louco criar de um povo.

sexta-feira, 28 de julho de 2006

CRIATURA Para Fernando Pessoa

Fazer poesia para mim é quase me encontrar com Deus. Afinal não é Ele. dos poetas, o maior? Que os poetas falam de flores, vôos de pássaros, azuis de borboletas sois poentes e tudo mais. E quando são poetas tristes, falam de musas e da sua beleza, e tecem comparações com as coisas da natureza. E mesmo os poetas loucos, que hoje invadem a cidade e cantam coisas de guerra, em versos mal silabados, falam do homem; das suas dores. E vendo toda essa poesia, natural, triste ou louca, eu penso em Deus Criador, que glosando em mote divino tantos temas produziu, prá nós, poetas menores.

tempo sem sol Para Bertold Brecht Foi um tempo de crise, foi um tempo sem sol, foi um tempo sem dó. Quem o viveu é que pode saber. Os gestos bons se tomaram escassos. As palavras congeladas nas bocas. Fúria e confusão, rodopiavam as mentes. A desconfiança instaurou-se como regime dos homens. As crianças mudas, caladas, estampavam nos olhos, pavor. Muitos tiveram desejos de morrer, outros tantos morreram. Quantos pelos caminhos caídos amontoados como restos usados que não têm mais valor. As cinzas cobriram as árvores, nem lembrança das flores restou. O medo profundo, corroeu um resto de humanidade que teimava em ficar, toda memória de calor, de afeto ou ternura dissolveu-se num vapor frio, pegajoso e úmido que a tudo e a todos uniu, num cemitério geral. Foi um tempo de crise. Foi um tempo sem sol. Sem sol, sem esperança e sem dó.

quarta-feira, 19 de julho de 2006

transverso Delicadas as fronteiras dos mundos em que habito e que, de um lado para o outro, sem perceber, transito. Neles as coisas podem ser e não ser, quase ao mesmo tempo, a depender somente das escolhas que fazemos, das cores que escolhemos para cobrir a matéria fina do pensamento. Porque o que parece importar, as vezes não tem importância própria. Mero pretexto, cenário ou trama, para exercitar o verdadeiro drama de se fazer escolhas e aprender com elas... O que será de nós, ó minha senhora, que de escolha em escolha nos enredamos, se delas perdemos os seus sentidos, e esquecidos dos seus verdadeiros motivos, nos distraímos com aquilo que elas parecem ser? Sublime então o desafio de viver, ao mesmo tempo sustentando, o gosto das escolhas que fazemos e o fazer das escolhas que gostamos... Sendo ao mesmo tempo, ator e autor, da peça que, vivendo, escrevemos... Representando os sentidos que, quaisquer outros, outros poderiam ser mas, que, sendo estes aqueles que escolhemos, nos fazem definitivamente ao vivê-los, eternamente responsáveis pelo que vivemos... O que será de nós minha senhora, é coisa que eu não sei... Mas eternamente nós seremos, responsáveis pelo que vivemos, e pelas escolhas que fazemos.

terça-feira, 11 de julho de 2006

LADAINHA Francisco dos farrapos meu bom santo, ilumina-me o meu caminho, ensina-me o amor do coração, ensina-me a falar aos passarinhos. Francisco dos farrapos meu bom santo, tu que se casaste com a pobreza ensina-me cortejar tão nobre dama, ensina-me a humildade e a nobreza. Francisco dos farrapos, Francisco roto e descalço, qual é o mistério que nos faz de todos iguais, de todos irmãos? Qual é o mistério, que doma a carne quando esta nos diz não? Francisco dos farrapos meu bom santo, Francisco roto e descalço que dos teus olhos irradias somente amor e bondade diga-me qual ë a batalha prá se conquistar a humildade? Se o meu coração te ouvisse mais que os ouvidos querem escutar, de te ouviria nesta hora, de tão contrito orar, Dizer-me da via tão simples na qual maltratastes teus pés. Nada querer. Não desejar. Na fé, a Deus se entregar. Mas meu coração não te ouve, não ouve, o que me tens prá falar os meus ouvidos não deixam de ti esperam resposta. Parado no mesmo lugar eu continuo a rezar. Francisco dos farrapos meu bom santo...
Um poemeto pateta. O poema, que pena! Não sabia Decidir: era clara ? era gema ? O que lhe fazia afinal, ser poema ? O poeta, Que pateta! Não sabia decidir : Era papo ? Era meta ? O que lhe fazia afinal, ser poeta ? Ema e Eta, as duas rimas assim coitadas, perdidas sem pó não sabiam pelas ruas andar nuas. Nem sabiam decidir: Poema ou poeta ? Talvez, quem sabe um poemeto pateta !

segunda-feira, 10 de julho de 2006

SANSSARA A gente brinca de roda. A roda roda. A roda brinca com a gente. A gente sobe. A gente desce. A roda brinca ate a gente cansar E a roda, só por gostar roda; não quer parar de brincar. Roda, Roda! E a gente a ajudar mesmo querendo parar, Um, dois, subiu, e treis, quatro desceu. De novo! Outra vez! Já! Da roda, correia e caçamba nossa força no rodar. _ Pare com isso menino! _Desce dai! Vai machucar... Mamãe e Papai a chamar. Menino surdo.. Menino burro... Pobre menino... Ele só não sabe como parar de brincar! Poesia que gera poesia... Surpresa boa quanda a poesia causa a leitora e a empurra para um post tao complementar... muito legal Nanda...muito bom Eu pedi, pedi, pedi.. pra roda parar de brincar porque depois que cansa perde a graça pra criança E aí grita-chora-berra-cala só quer o colo, não roda Mas aí Papai-do-Céu vem em sonho e diz: menina peralta, pediu pra brincar! E a menina pergunta "será?" Ela sabe que machuca, ela pede pra parar Tenta de todas as formas mas empurra sem querer É que a mulher-menina mais mulher do que menina mais menina que mulher não aprendeu a crescer. by nanda reboucas

sexta-feira, 7 de julho de 2006

ZA-ZEN Como criança incapacitada da fantasia e entediada com a monotonia do sempre igual brinquedo, num gesto de pouco pensar, lançei minhas coisas ao ar. E elas cairam: o preto no lugar do branco o azul, no do vermelho; o verde no do amarelo. E tudo teve um novo lugar. Brinquei, mas brinquei pouco. O gesto me deixou atento: uma ordem continuava a existir, proibindo o possível e sua mutabilidade. No ensaio de um gesto desesperado, lanço tudo de novo ao ar: Agora, j á! E descubro: O difícil não é mudar a ordem das coisas. Difícil é mantê-las no ar. Difícil é mudar as coisas da Ordem.
PRÓDIGO Eu. mineiro revelado, Nú, pelado! As montanhas que escondem MINAS não me escondem mais. Eu mineiro, dentro e fundo. Raso e descoberto; emergindo, emerso. Eu desmineirado, desmineirando. Cosmopolita, transcendo, traio e entrego o segredo das gentes gerais. Desato o nó, desfaço o tácito, anuncio em alto e bom som: MINAS, ó mundo; MINAS oculta o que não tem prá mostrar. MINAS oculta o seu vazio, o seu trágico e montanhoso VAZIO

quarta-feira, 5 de julho de 2006

NASCENTE A água de um olho geme, germina escorre, escoa. Empoça. A água de um olho sediciosa, silente forma por troça lagoa. A água de um olho escorre; esvai e no ventre da várzea se espalha, gigante e farta. E quem a vê assim no plácido da tarde nem imagina o olho, o olhosinho atoa, que cheio de manha enche a lagoa.
AS TENTAÇÕES DE SANTO ANTÃO São muitos os caminhos grande o perigo de se perder, em um volta da sombra ou no entardecer. São muitos os caminhos tramas, rodilhas, redil, redemoinhos vorazes, escondidos remansos de identificação sutil. São muitos os caminhos os para fora, exteriores e os outros de dentro emoções, sentimentos, humores São muitos os caminhos. Um só deles leva ao meu fim O perigo de me perder é que me faz sofrer assim...

domingo, 2 de julho de 2006

LAVADEIRAS (prá tia Helena) A água da lagoa lava, alveja, encardidos trapos finos lençóis. A água da lagoa lavra, gasta, dedos e mãos que nunca usaram anéis. A agua da lagoa leva lavadeiras derradeiras pedras, bacias e tintois. A água da lagoa lava, esfrega e apaga das memórias, presenças imemoriais. A água da lagoa, lavadeira passa, e ela fica no lugar.