BRASÍLIA 1979
No palácio reina o ditador
geme no planalto a flor de concreto.
O cerrado nunca dantes navegado
se estremece em sua nudez descoberto.
Nos versos minha conspiração de poeta.
Distante, a revolta, no calor do povo, transpira.
Aqui o poder tem o seu lugar
paletós de chapas brancas
burocratas de gravatas
atam e matam por decreto,
o novo: o louco criar de um povo.
domingo, 30 de julho de 2006
BRASÍLIA 1979
No palácio reina o ditador
geme no planalto a flor de concreto.
O cerrado nunca dantes navegado
se estremece em sua nudez descoberto.
Nos versos minha conspiração de poeta.
Distante, a revolta, no calor do povo, transpira.
Aqui o poder tem o seu lugar
paletós de chapas brancas
burocratas de gravatas
atam e matam por decreto,
o novo: o louco criar de um povo.
sexta-feira, 28 de julho de 2006
CRIATURA Para Fernando Pessoa
Fazer poesia para mim é quase me encontrar com Deus. Afinal não é Ele. dos poetas, o maior? Que os poetas falam de flores, vôos de pássaros, azuis de borboletas sois poentes e tudo mais. E quando são poetas tristes, falam de musas e da sua beleza, e tecem comparações com as coisas da natureza. E mesmo os poetas loucos, que hoje invadem a cidade e cantam coisas de guerra, em versos mal silabados, falam do homem; das suas dores. E vendo toda essa poesia, natural, triste ou louca, eu penso em Deus Criador, que glosando em mote divino tantos temas produziu, prá nós, poetas menores.
tempo sem sol
Para Bertold Brecht
Foi um tempo de crise,
foi um tempo sem sol,
foi um tempo sem dó.
Quem o viveu é que pode saber.
Os gestos bons se tomaram escassos.
As palavras congeladas nas bocas.
Fúria e confusão, rodopiavam as mentes.
A desconfiança instaurou-se como regime dos homens.
As crianças mudas, caladas, estampavam nos olhos, pavor.
Muitos tiveram desejos de morrer,
outros tantos morreram.
Quantos pelos caminhos caídos
amontoados como restos usados
que não têm mais valor.
As cinzas cobriram as árvores,
nem lembrança das flores restou.
O medo profundo, corroeu um resto de humanidade
que teimava em ficar,
toda memória de calor, de afeto ou ternura
dissolveu-se num vapor frio, pegajoso e úmido
que a tudo e a todos uniu,
num cemitério geral.
Foi um tempo de crise.
Foi um tempo sem sol.
Sem sol, sem esperança e sem dó.
quarta-feira, 19 de julho de 2006
transverso Delicadas as fronteiras dos mundos em que habito e que, de um lado para o outro, sem perceber, transito. Neles as coisas podem ser e não ser, quase ao mesmo tempo, a depender somente das escolhas que fazemos, das cores que escolhemos para cobrir a matéria fina do pensamento. Porque o que parece importar, as vezes não tem importância própria. Mero pretexto, cenário ou trama, para exercitar o verdadeiro drama de se fazer escolhas e aprender com elas... O que será de nós, ó minha senhora, que de escolha em escolha nos enredamos, se delas perdemos os seus sentidos, e esquecidos dos seus verdadeiros motivos, nos distraímos com aquilo que elas parecem ser? Sublime então o desafio de viver, ao mesmo tempo sustentando, o gosto das escolhas que fazemos e o fazer das escolhas que gostamos... Sendo ao mesmo tempo, ator e autor, da peça que, vivendo, escrevemos... Representando os sentidos que, quaisquer outros, outros poderiam ser mas, que, sendo estes aqueles que escolhemos, nos fazem definitivamente ao vivê-los, eternamente responsáveis pelo que vivemos... O que será de nós minha senhora, é coisa que eu não sei... Mas eternamente nós seremos, responsáveis pelo que vivemos, e pelas escolhas que fazemos.
terça-feira, 11 de julho de 2006
LADAINHA
Francisco dos farrapos
meu bom santo,
ilumina-me o meu caminho,
ensina-me o amor do coração,
ensina-me a falar aos passarinhos.
Francisco dos farrapos
meu bom santo,
tu que se casaste com a pobreza
ensina-me cortejar tão nobre dama,
ensina-me a humildade e a nobreza.
Francisco dos farrapos,
Francisco roto e descalço,
qual é o mistério que nos faz
de todos iguais, de todos irmãos?
Qual é o mistério, que doma a carne
quando esta nos diz não?
Francisco dos farrapos
meu bom santo,
Francisco roto e descalço
que dos teus olhos irradias
somente amor e bondade
diga-me qual ë a batalha
prá se conquistar a humildade?
Se o meu coração te ouvisse
mais que os ouvidos querem escutar,
de te ouviria nesta hora,
de tão contrito orar,
Dizer-me da via tão simples
na qual maltratastes teus pés.
Nada querer. Não desejar.
Na fé, a Deus se entregar.
Mas meu coração não te ouve,
não ouve, o que me tens prá falar
os meus ouvidos não deixam
de ti esperam resposta.
Parado no mesmo lugar
eu continuo a rezar.
Francisco dos farrapos
meu bom santo...
Um poemeto pateta.
O poema,
que pena!
Não sabia
Decidir:
era clara ?
era gema ?
O que lhe fazia
afinal, ser poema ?
O poeta,
Que pateta!
Não sabia
decidir :
Era papo ?
Era meta ?
O que lhe fazia
afinal, ser poeta ?
Ema e Eta,
as duas rimas
assim coitadas,
perdidas sem pó
não sabiam
pelas ruas
andar nuas.
Nem sabiam
decidir:
Poema ou poeta ?
Talvez, quem sabe
um poemeto pateta !
segunda-feira, 10 de julho de 2006
SANSSARA
A gente brinca de roda.
A roda roda.
A roda brinca com a gente.
A gente sobe.
A gente desce.
A roda brinca ate a gente cansar
E a roda, só por gostar roda;
não quer parar de brincar.
Roda, Roda!
E a gente a ajudar
mesmo querendo parar,
Um, dois, subiu, e treis, quatro
desceu. De novo! Outra vez! Já!
Da roda, correia e caçamba
nossa força no rodar.
_ Pare com isso menino!
_Desce dai! Vai machucar...
Mamãe e Papai a chamar.
Menino surdo.. Menino burro...
Pobre menino... Ele só não sabe
como parar de brincar!
Poesia que gera poesia...
Surpresa boa quanda a poesia
causa a leitora e a empurra
para um post tao complementar...
muito legal Nanda...muito bom
Eu pedi, pedi, pedi..
pra roda parar de brincar
porque depois que cansa
perde a graça pra criança
E aí grita-chora-berra-cala
só quer o colo, não roda
Mas aí Papai-do-Céu vem em sonho e diz:
menina peralta, pediu pra brincar!
E a menina pergunta "será?"
Ela sabe que machuca,
ela pede pra parar
Tenta de todas as formas
mas empurra sem querer
É que a mulher-menina
mais mulher do que menina
mais menina que mulher
não aprendeu a crescer.
by nanda reboucas
sexta-feira, 7 de julho de 2006
ZA-ZEN
Como criança incapacitada da fantasia
e entediada com a monotonia do
sempre igual brinquedo,
num gesto de pouco pensar, lançei
minhas coisas ao ar.
E elas cairam:
o preto no lugar do branco
o azul, no do vermelho;
o verde no do amarelo.
E tudo teve um novo lugar.
Brinquei, mas brinquei pouco.
O gesto me deixou atento:
uma ordem continuava a existir,
proibindo o possível e sua
mutabilidade.
No ensaio de um gesto desesperado,
lanço tudo de novo ao ar:
Agora, j á!
E descubro:
O difícil não é mudar a ordem das coisas.
Difícil é mantê-las no ar.
Difícil é mudar as coisas da Ordem.
PRÓDIGO
Eu. mineiro revelado,
Nú, pelado!
As montanhas que escondem MINAS
não me escondem mais.
Eu mineiro, dentro e fundo.
Raso e descoberto; emergindo, emerso.
Eu desmineirado, desmineirando.
Cosmopolita, transcendo,
traio e entrego
o segredo das gentes gerais.
Desato o nó,
desfaço o tácito,
anuncio em alto e bom som:
MINAS, ó mundo;
MINAS oculta o que não tem prá mostrar.
MINAS oculta o seu vazio,
o seu trágico e montanhoso VAZIO
quarta-feira, 5 de julho de 2006
NASCENTE
A água de um olho
geme, germina
escorre, escoa.
Empoça.
A água de um olho
sediciosa, silente
forma por troça
lagoa.
A água de um olho
escorre; esvai
e no ventre da várzea
se espalha,
gigante e farta.
E quem a vê assim
no plácido da tarde
nem imagina o olho,
o olhosinho atoa,
que cheio de manha
enche a lagoa.
AS TENTAÇÕES DE SANTO ANTÃO
São muitos os caminhos
grande o perigo de se perder,
em um volta da sombra
ou no entardecer.
São muitos os caminhos
tramas, rodilhas, redil,
redemoinhos vorazes,
escondidos remansos
de identificação sutil.
São muitos os caminhos
os para fora, exteriores
e os outros de dentro
emoções, sentimentos, humores
São muitos os caminhos.
Um só deles leva ao meu fim
O perigo de me perder
é que me faz sofrer assim...
domingo, 2 de julho de 2006
LAVADEIRAS
(prá tia Helena)
A água da lagoa lava,
alveja, encardidos trapos
finos lençóis.
A água da lagoa lavra,
gasta, dedos e mãos
que nunca usaram anéis.
A agua da lagoa leva
lavadeiras derradeiras
pedras, bacias e tintois.
A água da lagoa lava,
esfrega e apaga
das memórias,
presenças imemoriais.
A água da lagoa,
lavadeira passa,
e ela fica no lugar.


